Nossos Termos de Uso atualizados entrarão em vigor em 25
de maio de 2012. Saiba mais.
Thomas Müntzer
origem:
Wikipédia, a enciclopédia livre.
Thomas Müntzer.
Thomas Müntzer (também Muentzer ou Münzer;
1489
ou 1490 - 1525) foi um teólogo revolucionário alemão que se destacou no tempo da Reforma Protestante
No contexto da história da Reforma, Thomas Müntzer é uma
das personagens mais controvertidas, capaz de suscitar julgamentos díspares.
O sociólogo Ernst Bloch diz que "quando o analisamos enquanto homem de ação, ressaltam nele o presente e o absoluto, numa perspectiva mais altaneira e mais ampla que numa experiência demasiado vivida, e apesar disto, com vigor idêntico, Müntzer é, antes de tudo, História, no sentido fecundo (…) para comprometer-nos, entusiasmar-nos, para apoiar, sempre mais amplamente, nosso desígnio".[1]
O sociólogo Ernst Bloch diz que "quando o analisamos enquanto homem de ação, ressaltam nele o presente e o absoluto, numa perspectiva mais altaneira e mais ampla que numa experiência demasiado vivida, e apesar disto, com vigor idêntico, Müntzer é, antes de tudo, História, no sentido fecundo (…) para comprometer-nos, entusiasmar-nos, para apoiar, sempre mais amplamente, nosso desígnio".[1]
Já o teólogo Paul Althaus
viu nele "o lúgubre, o negro fervor das idéias teocrático-taboritas"
que o ligavam à "exasperação dos camponeses" confrontados com a
"pureza ética" do posicionamento de Lutero.[2]
Por seu turno, o teólogo luterano Eric Gritsch, chama-o de
"reformador sem Igreja".[3]
Thomas Müntzer era um teólogo e jamais deixou de sê-lo, mesmo quando
enveredou pela arriscada trilha da política revolucionária.
Embora seja geralmente apresentado como um anabatista e líder dos
camponeses rebeldes, a verdade é que Müntzer jamais demonstrou grande interesse
pela questão do quando e como batizar (pedra angular do anabatismo) e sua
participação efetiva na Guerra dos camponeses deu-se apenas no fim de sua vida,
quando comandou o grupo de campônios massacrado em Frankenhausen.
Malgrado sua retórica inflamada e revolucionária estabelecer muitos
pontos de contato com a doutrina anabatista e as reivindicações sociais dos
camponeses, Muntzer seguiu seu próprio caminho, pautado por interpretações
apocalípticas da Bíblia, onde se via como um profeta empenhado em construir o
Reino de Deus na Terra.[4]
Mas ao associar o advento desse Reino a uma radical reforma social, que
eliminaria distinções e privilégios, ele se indispôs com as nobrezas católica e
luterana - que disputavam o poder de definir os rumos da cristandade ocidental
-, comprando uma briga que não podia ganhar.
Foi esmagado nela.
Quatro diferentes Thomas Müntzers sobreviveram na História.
- Para os protestantes ortodoxos, ele teria sido um típico anabatista que não fez outra coisa senão proclamar suas doutrinas de sectarismo radical.
- Para os anabatistas de Zurique, mesmo com ressalvas, ele era veraz e fiel mensageiro do Evangelho.
- Para os historiadores católicos romanos, Müntzer simplesmente operou dentro das inevitáveis conseqüencias do individualismo protestante.
- Para os historiadores marxistas, ele pontificou como o grande ideólogo da Guerra dos Camponeses, o primeiro político cosmopolita.
[editar]
Biografia
Thomas Müntzer nasceu na pequena vila de Stolberg, nas montanhas de Harz. Educou-se em Leipzig e Frankfurt an der Oder, obtendo o mestrado e
completando o Bacculareus biblicus.[5] Dominava o grego, o hebraico e o latim.
Foi ordenado padre em 1513, tornando-se
prepósito-confessor no convento feminino de Beuditz
onde, com a segurança e a disponibilidade de tempo proporcionados por sua
posição, passou mais de um ano estudando os livros de Flávio Josefo, a História
Eclesiástica de Eusebius, Santo Agostinho, os Atos dos conselhos gerais, e
os Atos dos concílios de Constance e
de Basiléia.
Em 1517, entrou em contato com a discussão que se
acendia em torno do professor da Universidade de Wittenberg, Martinho Lutero. Até 1520,
Müntzer trocou, por diversas vezes, o local de suas atividades, sendo que,
nesse período, entre 1517 a 1520, tornou-se adepto da causa de Lutero,
a quem conheceu, provavelmente, em 1519.
Assim como Lutero, Müntzer passava, nessa época, por profundas dúvidas.
Mas enquanto Lutero queria entender Deus, cheio de sentimentos de culpa e
pavor, Müntzer desesperava-se por não possuir a Deus e o seu poder,
martirizando-se com a questão se a doutrina de Cristo era, realmente, procedente de Deus.[6]
À semelhança de Lutero,[7] Müntzer voltou-se para os místicos alemães, começando a ler as obras de Eckhart, Suso
e Tauler. Na leitura desses livros, ele encontrou a
afirmação de que Deus primeiro lança a todos os seus amigos na noite do
desespero (assim como ele, Müntzer), antes de permitir que o seu sol brilhe
sobre eles. Encontrou, ainda, a afirmação de que o eterno Deus se revela aos
seus no mais profundo da alma, sem meios exteriores. Ou seja, que o homem pode
sentir Deus e ter certeza absoluta Dele, e que, para isso, é preciso abandonar
tudo o que não é Deus. Müntzer experimentara a "noite", mas
faltava-lhe sentir Deus.
Em 1520, com a recomendação de Lutero, foi indicado
como pregador do evangelho na igreja de Santa Maria, em Zwickau, substituindo, temporariamente, o pastor Johannes
Sylvius Egranus.
[editar]
Fé revolucionária
Àquele tempo, Zwickau vivia dias agitados, por conta de uma seita chiliástica de religiosos revolucionários,
conhecidos como os "Profetas de Zwickau". Os membros da seita -
profundamente influenciados pela linha taborita[8] dos Hussitas - tinham bons conhecimentos bíblicos,
diziam ter feito experiências com o Espírito Santo, e pretendiam erigir o Reino de Deus, eliminando todos os não-crentes.
Em sua procura por uma experiência com Deus, foi de vital importância,
para Müntzer, o encontro com o tecelão Nicholas Storch, líder daquela seita. A partir do
relacionamento entre os dois, Müntzer não somente adotou a idéia da
concretização terrestre do Reino de Deus, difundida pelos taboritas, bem como
os métodos radicais propostos e praticados por Storch e seu grupo.
Os sermões de Müntzer, em Zwickau, se foram tornando crescentemente
violentos, resultando em problemas com a Assembléia Municipal da cidade e com a
congregação de Santa Maria. Obrigado a devolver o púlpito a Johannes Egranus,
ele tornou-se pastor de Santa Catarina, uma grande congregação composta por
mineiros, tecelões pobres, e desempregados. Foi lá que Müntzer tornou-se,
conscientemente, um pastor de pobres, afastando-se, mais ainda, do luteranismo
ortodoxo, e assumindo o discurso apocalíptico dos "Profetas". E visto
que sua relação com a Assembléia Municipal assumiu um crescente antagonismo, na
primavera de 1521, ele recebeu ordem para sair de Zwickau.
Müntzer transferiu-se para Praga onde foi, inicialmente,
bem acolhido pelos luteranos locais, sendo convidado a pregar em várias
igrejas. Mas também ali não tardou para que seus sermões inflamados, eivados,
por vezes, de uma linguagem grosseira, afastassem os sofisticados cidadãos de
Praga. Desiludido, ele deixou a cidade, em dezembro de 1521, não sem antes
(imitando Lutero) pregar nas portas das principais igrejas, um manifesto[9] resumindo suas principais idéias
milenaristas.
Ao longo de 1522, Müntzer vagou por várias pequenas cidades e
aldeias, sem obter uma ocupação regular. Até que foi aceito como pastor da
Igreja de São João, na pequena cidade de Alstedt
(Saxônia), em 1523.
Os dezesseis meses que Müntzer permaneceu em Alstedt, foram os mais
profícuos de sua vida de teólogo. Escreveu e celebrou a primeira Eucaristia no
idioma alemão e depois publicou um missal completo com liturgias para Comunhão,
Batismo, Matrimônio, e funerais, inclusive confissão pública de pecado antes da
comunhão. Casou-se com ex-freira, Ottilie von Gersen, de quem teve um filho.
Seus sermões - ainda tempestuosos, porém mais brandos do que os de Zwickau - ,
fizeram dele o pastor mais popular de todo distrito. As pessoas vinham dos
arredores para ouvi-lo e sua liturgia tendia ser amplamente adotada pelos
luteranos.
Porém não tardou para que ele retomasse sua mensagem apocalíptica,
apresentando-se, abertamente, como um homem escolhido de Deus para sanear o
mundo corrompido. Ao mesmo tempo, integrando-se ao espírito da Revolta dos
Camponeses - que grassava em vários pontos da Alemanha -, ele começou a organizar,
secretamente, um grupo revolucionário - a "Liga dos Eleitos" -,
dedicado a atacar conventos e monastérios na zona rural e nos arredores da
cidade. Também envolveu-se em áspera disputa com o senhor local, o Conde de
Mansfeld [7].
Suas divergências com Lutero se tornaram mais nítidas nos numerosos
panfletos que ele passou a, constantemente, emitir. Neles, Lutero é denunciado
como impostor, pois se abstém de intervir na luta contra injustiças sociais,
chegando até, ao contrário, a justificá-las, para granjear apoio dos príncipes.
Daí a comparação com os sábios da corte de Nabucodonosor, incapazes, como Lutero - porque
vis bajuladores do poder - de descobrir o sentido dos sonhos, isto é, da História. Para Muntzer, a fé do cristão não pode
escravizar-se a uma doutrina de predestinação, esperando ser escolhido para o
Reino de Deus, porém deve ser uma fé revolucionária, que liberta e que confere
forças ao homem para construir o Reino de Deus na Terra.
Preocupado com a fama de Müntzer, o eleitor da Saxônia, Frederico,
encarregou seu irmão, duque João, de investigar o inflamado pregador. Convocado
a expor suas idéias, Münzer formulou, em 13 de julho de 1524, aquela que foi
considerada a mais extraordinária expressão vocal pública da era da Reforma,
baseada em visões apocalípticas do livro de Daniel.
[editar]
Sermão para a nobreza
Na primeira parte de seu sermão, Müntzer desenvolve a concepção de que a
história da Igreja é a história da progressiva deterioração de uma situação
inicial ideal. Cristo e seus apóstolos e, antes deles, os profetas, deram início
a uma cristandade pura, mas seus sucessores foram maus servidores da Igreja que
não tiveram o fervor necessário para levar a cabo o que Cristo iniciara. A
Igreja iniciada logo estava em ruínas.
Os pobres camponeses foram iludidos com respeito ao verdadeiro
significado do Espírito de Cristo, pois "em seu lugar foi colocada uma
bela, delicada e áurea divindade, ante a qual os pobres camponeses ficam se
babando".
Com seu mágico culto cerimonial, com seu culto às imagens, a igreja
romana ocultou aos pobres e oprimidos o verdadeiro caráter revolucionário do
Espírito de Cristo. É necessário, pois, uma grande e poderosa força, que será
dada de cima, para castigar e debilitar esta indizível maldade. Deve-se usar
"mão poderosa contra os inimigos de Deus".
Na segunda parte, Müntzer continua a desenvolver sua reflexão a respeito
da adulteração da cristandade e demonstra que esta abominação não é apenas uma
característica da igreja católica, mas também de seus novos adversários, os
astutos escribas semelhantes a Lutero, que enganam a pobre gente ignorante,
dizendo-lhe que Deus já não revela seus segredos divinos por meio de visões
verdadeiras ou de sua palavra audível, e fazem objeto de burla os homens que se
ocupam com a revelação.
Na terceira parte, Müntzer desenvolve, em rápidos traços, sua concepção
do ouvir da palavra interna no "abismo da alma", sem o que nenhum
homem pode dizer algo profundo a respeito de Deus, "ainda que haja
devorado cem mil Bíblias". Porque a verdadeira palavra não se encontra nem
na letra da Escritura, nem na luz natural da razão, mas no coração humano, e o
homem somente se apercebe dela, quando Deus lhe envia o impulso ao coração.
Esse impulso "é cruz, necessidade e aflição".
Na quarta parte, Müntzer reúne sua teologia do Espírito com sua visão da
história, chegando a uma aplicação político-revolucionáría.
O alvo da revolução é levar a pessoa a sua verdadeira finalidade: a vida
com e em Deus. A mudança das condições políticas e sociais vigentes criará a
possibilidade para a redenção da humanidade do mal. Havendo mudança das
condições externas de vida, ocorrerá também a mudança interna. E o momento da
mudança é chegado.
O que Müntzer quer é a revolução e não a evolução pregada por Lutero.
Destruída a velha igreja, surgirá uma nova ordem social e a humanidade voltará
ao "comunismo do amor" da cristandade primitiva. Mas para isso, devem
ser eliminados todos aqueles que se opõem à vontade de Deus.
Com uma autoconfiança incrível, Müntzer convoca os príncipes saxões a
assumirem o comando desse processo de mudança, eliminando os
"perversos" pois "o homem ímpio não tem direito de viver, onde
estorva os justos".
Seu sermão foi impresso e distribuído, desagradando o Eleitor Frederico,
outros príncipes, e Lutero. Em conseqüência, o Conselho de Alstedt foi pressionado
para expulsar Müntzer, mas antes disso, na noite de 7 de agosto de 1524,
ele saiu da cidade, deixando para trás sua esposa, seus filhos e suas posses.
Escultura em homenagem a Thomas Müntzer em Stolberg (Ex-RDA).
[editar]
Frankenhausen
Após passar algum tempo viajando, Müntzer chegou a Mühlhausen, onde o
militante anabatista Henry Pfeiffer organizara sua Liga dos Eleitos visando
assumir a cidade. Quando a cidade caiu em poder dos radicais, Müntzer
colocou-se à frente de deles, preparando Mühlhausen para aderir à revolta dos
camponeses, que se aproximava, e cuja vitória ele profetizava.
Na primeira semana de maio de 1525, o exército camponês, entre
oito e dez mil, entrou em Frankenhausen,
que tinha sido tomada por revolucionários de Mühlhausen. Enquanto isso, o Duque
João, que havia se tornado eleitor pela morte de seu irmão em quatro de maio, e
outros príncipes das vizinhanças, levantaram um exército sob o comando de
Filipe, proprietário de terras em Hesse, que imediatamente
marchou para encontrar os campônios.
No dia 15, Felipe atacou com cerca de cinco mil artilheiros e dois mil
cavaleiros. À frente dos camponeses, Müntzer, que não tinha conhecimento militar,
enfrentou os exércitos da nobreza com oito canhões sem munição, uma bandeira
com o símbolo do arco-íris e uma espada. Os camponeses foram feitos em pedaços.
Cinco mil morreram no campo de batalha, seiscentos foram capturados, e o
restante fugiu para as florestas da Turíngia. O exército de Filipe perdeu apenas seis
homens.
Muntzer foi preso, torturado e decapitado em 27 de maio de 1525.
[editar]
Citações
- Aí o homem pensa que não tem fé nenhuma. Sim, segundo lhe parece, não encontra fé alguma. Ele sente ou encontra um anseio muito pequeno à procura da verdadeira fé, que é tão fraco que mal e dificilmente consegue vislumbrar em si. (…) Ah, como gostaria de crer direito, se tudo dependesse disso, se ao menos eu soubesse qual é o caminho correto. Sim, eu correria até o fim do mundo.
- Trecho de uma carta de Müntzer, escrita entre 1517 e 1520. - O Deus eternamente vivo nos ordenou destronar-te com a força que nos foi outorgada.
- Trecho de
uma carta de Müntzer ao conde Ernesto de Mansfeld, ligado ao imperador Carlos
V.
- Deus deu senhores e príncipes por ter estado irado, mas em tempo Ele os removerá em seu desgosto. Se os príncipes agirem não só contra o evangelho, mas também contra os direitos naturais do povo, devem eles ser estrangulados como cães
- Trecho do
sermão de Müntzer à corte imperial, em Worms.
Referências
- ↑ Bloch, Ernst. Thomas Müntzer - Teólogo da revolução. Rio de Janeiro: Biblioteca Tempo universitário, 1973, pp. 1-7.
- ↑ Gritsch, Eric. Reformer without a Church: Thomas Müntzer, Philadelphia, 1967
- ↑ Bacharel em Bíblia, título que qualificava seu portador a ensinar a Bíblia.
- ↑ Friesen, Abraham e Goertz , Hans-Jürgen. Thomas Müntzer. Darmstadt: Wissenschaftliche Buchgesellschaft, 1978, pg 16-30
- ↑ Desde 1516, Lutero animava seus alunos e adeptos a que lessem as obras de Tauler e de outros místicos alemães.
- ↑ Núcleo combatente dos Hussitas. Tinham por principal reduto a cidade de Tabor.
- ↑ O Manifesto de Praga sobreviveu em quatro versões diferentes, escritas em Latim e em Alemão.