terça-feira, 7 de julho de 2009

THOMAS MUNTZER - O TEÓLOGO DA REVOLUÇÃO

RESENHA: THOMAS MÜNTZER, TEÓLOGO DA REVOLUÇÃO. ERNST BLOCH.
Patrícia Matos de Mello.

Principais propostas de Thomas Müntzer e as repercussões do anabatismo.

A obra de Ernst Bloch tem bastante importância por ter a proposta de contribuir para um campo pouco explorado pela historiografia: a vida de Thomas Müntzer e suas considerações teológicas. Como Bloch aponta no início de seu livro, o tema é pouco abordado devido à escassez de fontes e, assim, fala apenas resumidamente sobre o nascimento de Müntzer e sobre sua vida antes de assumir sua missão teológica ou revolucionária. Portanto Bloch concentra sua análise a partir do momento em que Müntzer inicia sua pregação.

Müntzer fazia parte de um contexto histórico marcado pela crise do antigo sistema feudal e pela transição para nova forma de organização da sociedade com o advento das cidades e o desenvolvimento do capitalismo. Ligado ao mundo da aldeia, Müntzer organiza suas propostas entorno dos problemas vividos por ele e pelos camponeses em geral. Uma das principais questões de sua formulação teológica é a igualdade. Através do sacrifício de Cristo na cruz todos os homens se tornaram iguais perante Deus e livres do “jugo do pecado”. Com base nisso, Müntzer coloca no mesmo patamar tanto os senhores como os servos e é criticado por Lutero, uma vez que estaria reduzindo a liberdade a algo meramente carnal. Esse traço do pensamento de Müntzer (associado ao lema "omnia sunt communia") foi interpretado por alguns como uma formulação pré-socialista. No entanto, o que está em questão é algo muito diferente do socialismo do século XIX e no máximo pode-se dizer que isso se refere ao comunismo primitivo do início dos séculos da Era Comum e à preocupação em se viver, em todos os sentidos, segundo a natureza humana do Filho de Deus.

As reformas religiosas do século XVI, para além das preocupações doutrinárias, reinterpretam a relação do homem com Deus e a relação dos homens entre si. Nesse sentido, é fundamental pensar a questão do livre arbítrio. Ao se aceitar a tese do livre arbítrio, confere-se ao homem o poder de escolha e de intervenção no seu próprio destino e nega-se, portanto, a onipotência divina. Para Müntzer é importante sustentar essa tese, pois toda sua proposta se concentra na alteração da realidade da vida na aldeia através da atuação do homem e não através da intervenção milagrosa da onipotência divina (muito embora os sinais de Deus que garantissem o apoio e vitória à causa fossem importantes). Esse é um grande ponto de divergência entre Müntzer e Lutero, já que, o segundo, ao negar a existência do livre arbítrio (e sustentar a tese do servo arbítrio) transfere todo o poder a Deus, que predetermina todas as coisas. Ligado a isso, Lutero ainda defende a idéia de vocação, de um chamado ao qual cada um deve responder ao longo de sua vida e, nesse sentido, prende o homem cristão à realidade em que vive e restringe seu campo de atuação à esfera meramente espiritual.

Ernst Bloch expõe as principais características da teologia luterana, da católica e trata bem superficialmente da doutrina calvinista. O autor aborda também o alcance do movimento anabatista não só na Alemanha, mas ainda na Hungria, na Ucrânia, no Missouri, na Holanda, na França etc. Todavia, o fator fundamental para o posterior sucesso do movimento iniciado por Müntzer foi justamente a alteração de suas propostas iniciais. Menno Simons foi o responsável pela renovação do anabatismo, que consistiu na incorporação de elementos de orientação calvinista. Essa doutrina menonita teve repercussão inclusive na Inglaterra em 1648 no movimento dos levellers e dos diggers com os ideais milenaristas do quinto Império universal, já defendido por Müntzer. Essa fusão de elementos teológicos diversos e contraditórios nos faz pensar sobre o papel da religião num mundo onde Deus ainda não foi morto, pelo contrário, está vivo, fala e atua através dos novos profetas, (seja para garantir a igualdade, a liberdade e o estabelecimento da Jerusalém terrestre em Müntzer, seja para garantir o cumprimento da vocação de cada homem e conferir a salvação aos eleitos em Lutero) e, o mais importante, nos permite refletir sobre os limites tênues entre religião e política, pelo menos nesse momento.

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